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O Beco do Chão Salgado: O atentado ao rei D. José

O Beco do Chão Salgado contém uma curiosa escultura em forma de padrão, que envolve algum mistério para quem se depara com ele pela primeira vez, não sabendo que simboliza um dos momentos mais negros da História de Portugal.

A ideia de Rei Absoluto em Portugal – de que a concentração do poder no rei é praticada existe – desde o reinado de D. Afonso Henriques. Mas foi com D. João V que o Absolutismo se afirmou todo-poderoso. Exercia o poder com soberania exagerada, mas não sem critério, procurando associar os nobres às suas decisões.

Porém, onde o Absolutismo esteve mais aceso foi no reinado de D. José, em grande parte praticado pelo Marquês de Pombal.

O caso é mais notório na forma como ele exerceu a sua política, evidente na violência desproporcionada e injusta que utilizou. Uma das ações mais cruéis que realizou foi o julgamento dos Távora.

Antecedentes: O atentado ao Rei D. José

D. José, depois do terramoto, ficou a viver na Ajuda, onde estava a corte. A 27 de Agosto de 1758, o rei saiu para ir a casa de sua amante, Teresa de Távora, mulher de Luís Bernanrdo, herdeiro dos Távora. Tinha ele acabado de a deixar, num coche não oficial, para não ser visto, emprestado pelo sargento-mor Pedro Teixeira, é inesperadamente atacado por três homens encapuzados a cavalo e atingido por disparos: ele num braço e nas costas e o seu cocheiro no peito.

Bastante feridos, seguem para o palácio no Marquês de Angeja (hoje Biblioteca de Belém), na rua da Junqueira, para se camuflar do incidente e para lhe tratarem dos ferimentos. Ali passou a noite e só no dia seguinte, sob escolta oficial, seguiu para a Real Barraca, onde ficou retido durante três meses, em recuperação.

Entretanto, encarrega o seu ministro, Sebastião José de Carvalho e Melo, de organizar um inquérito de modo a encontrar os responsáveis pelo atentado. Para o processo recorreu aos Secretário de Estado Tomás da Costa e D. Luís da Cunha, juntamente com o juiz do tribunal da Suprema Junta Inconfidência, que iria julgar os réus

Dias depois são presos dois dos atacantes que alegadamente confessaram terem sido mandatários dos Távora, que estariam a conspirar para pôr o duque de Aveiro no trono. Estes foram, pouco depois, condenados à forca.

Na madrugada de 9 de Dezembro são cercadas as casas e começaram a ser presos os alegados cúmplices deste atentado: a marquesa D. Leonor de Távora; o seu marido D. Francisco de Assis; o duque de Aveiro, D. José Mascarenhas, o marquês de Alorna, D. João de Almeida Portugal; o conde de Atouguia, D. Jerónimo de Ataíde, com as respetivas famílias, bem como muitos outros nobres, padres jesuítas e até os seus criados. Todos eram acusados de crimes de traição e lesa-magestade.

O julgamento

Seguiu-se um processo irregular e apressado, em que a defesa, muito intimidada, teve acesso muito limitado ao processo. Os inquiridores basearam a sua acusação na confissão dos atiradores, obtida sob tortura, reforçados pelas confissões tiradas ao duque de Aveiro obtidas pelo mesmo processo e ainda pela suposição de que só os Távora poderiam ter conhecimento da visita do rei à sua amante àquela hora.

Este processo condenou severamente três famílias: a do conde de Atouguia, a do duque de Aveiro e a do marquês de Távora. Estas famílias eram os elementos mais organizados da oposição à política mercantilista do ministro do rei.

Os seus títulos de nobreza foram extintos, os seus bens confiscados para a Coroa e os seus brasões picados das fachadas dos seus edifícios. O nome da família Távora foi proibido. O palácio do duque de Aveiro foi destruído e o seu chão salgado para impedir que alguma coisa mais nascesse. Nesse local foi mandado erigir um padrão em memória da condenação do duque de Aveiro, do marquês de Távora e a sua família por alegada implicação no atentado contra D. José. O monumento é composto por uma coluna, envolta em 5 anéis, um por cada cabeça derrubada, assente sobre uma base quadrangular. O próprio monumento apresenta uma inscrição que relata esse episódio.

Padrão do Beco do Chão Salgado. Na sua base está descrito todo o episódio, desde o atentado à execução da sentença.

A maioria das condenações consistia em garrotar os condenados e lhes partirem os braços e pernas com um maço para por fim os corpos serem queimados e as cinzas deitas ao mar. À marquesa de Távora, seria cortada a cabeça em golpe de espada e ao corpo se daria o mesmo destino. Ao marquês de Távora e ao conde de Atouguia seriam quebrados os braços e pernas, depois garrotados e sujeitos à fogueira. António Álvares e José Policarpo de Azevedo, criados do duque de Aveiro foram condenados à fogueira, sendo as cinzas deitadas ao mar.

As famílias foram condenadas até à terceira geração, incluindo crianças. Só não houve mais condenações à morte graças às intervenções de D. Mariana, mulher de D. José, e da filha Maria Francisca, futura D. Maria I.

A sentença foi proferida a 12 de Janeiro de 1759 e foi executada no dia seguinte, no Cais Grande, em Belém. Toda a corte foi obrigada a assistir às execuções, que decorreram em praça pública.

Os Távora estiveram mesmo implicados no atentado ao Rei?

Quando D. Maria I tomou o trono, depois de demitir o ministro, autorizou a revisão de vários processos, incluindo este. A revisão do processo culpabilizou o duque de Aveiro e inocentou os restantes. No entanto, a sentença nunca foi tornada pública, pois querendo D. Maria I devolver os feudos aos descendentes dos antigos donos, viu-se na impossibilidade de o fazer, pois o seu valor ser tão elevado como o erário público.

Uma coisa foi certa: D. José e o cocheiro foram atingidos. Ao sargento-mor, Pedro Teixeira que os acompanhava, nada aconteceu.

Era conhecido o ódio que os Távora tinham ao rei, por estarem contra o facto de este ser amante de D. Teresa de Távora, o que fez com que se separasse do seu marido, Luís Bernardo. Marquês de Pombal foi encarregado por D. José de fazer diligências para que o casal voltasse a viver junto, mas em vão, o que desagradou a D. José. Mais tarde chegou a tratar pessoalmente do caso junto de D. Francisco de Assis, prometendo-lhe favores políticos, que este recusou, o que o irritou ainda mais. Esta situação despontou ainda mais o ódio pelo rei, e naturalmente fez com que conspirassem contra o monarca e o seu ministro.

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